sexta-feira, 22 de maio de 2020

83% dos professores ainda se sentem despreparados para dar aulas online

Depois de seis semanas de isolamento social por conta da pandemia, 83% dos professores brasileiros, em média, ainda se sentem nada ou pouco preparados para o ensino remoto. É o que aponta a pesquisa “Sentimento e percepção dos professores brasileiros nos diferentes estágios do Coronavírus no Brasil”, do Instituto Península, realizada com 7.734 mil professores de todo o país entre os dias 13 de abril e 14 de maio de 2020.

A insegurança dos professores em relação ao ensino a distância está ligada a outra estatística da pesquisa: 88% deles afirmaram que nunca tinham dado aula de forma virtual antes da pandemia. É o caso de Débora Nogueira, professora de uma escola particular na zona norte de São Paulo. Em 30 anos lecionando, é a primeira vez que ela precisa encarar a câmera do celular para preparar conteúdos para os seus alunos.

Além de enfrentar a vergonha para gravar os vídeos e as dúvidas sobre como produzir um conteúdo atrativo, ela conta que o desafio é ainda maior quando se tem alunos de apenas 5 anos, como seu caso. “Ficamos preocupados em não deixar de atender a necessidade da criança, tanto no conteúdo como na parte emocional. É nosso dever também ajudar ela a entender e assimilar essa situação delicada por que passamos”, afirma a professora. 

Essa dificuldade também aparece no levantamento. Segundo a pesquisa, os professores de Educação Infantil são os que se sentem menos preparados para o ensino online. Débora aponta a falta que os recursos da sala de aula, como a lousa, e os espaços externos da escola, como o parque, impactam no ensino para crianças. “Se não for tudo muito bem contextualizado, é difícil o aluno entender. Eu praticamente tive que desmontar a minha casa para buscar recursos e materiais lúdicos para produzir as videoaulas”, conta a professora com bom humor.

Outro desafio que os educadores enfrentam em época de ensino a distância obrigatório é o contato efetivo com os alunos, principalmente na rede municipal e estadual. Na escola municipal onde Denise Aparecida trabalha, por exemplo, o principal canal de conversa entre professores, alunos e familiares durante a quarentena está sendo o Facebook da instituição.

Ela explica que a maioria dos alunos não tem acesso à internet em computadores, o que dificultou em pensar em outras plataformas mais elaboradas: “A gente precisou pensar na realidade deles, e como a internet no celular, com planos básicos, é um pouco mais acessível, e os pais têm mais familiaridade com a rede social, o Facebook foi a melhor saída”. 

Então, por meio de publicações diárias, as professoras levam, de forma online, brincadeiras educativas e se esforçam para manter o vínculo tão importante entre escola e famílias. “Apesar de ainda serem poucos pais que estão interagindo com a gente, é um primeiro passo. Além disso, a equipe está empenhada em divulgar o canal para alcançar o maior número de famílias possível”, afirma Denise. 

As redes sociais têm sido a segunda forma de contato mais usada pelos docentes durante a quarentena, de acordo com o estudo. A primeira, com 83%, é o WhatsApp. Só na rede privada que os ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) ganham espaço frente a essas ferramentas. 

A falta de suporte

São poucas semanas de adaptação para que o ensino remoto se torne algo tranquilo. Além disso, a pouca oferta de treinamento e apoio das instituições e redes de ensino não tem ajudado os professores: 55% não tiveram qualquer suporte ou capacitação durante o isolamento social para ensinar fora do ambiente físico da escola. Assim, os professores se sentem despreparados para o ensino virtual, mas o interesse é latente: 75% gostariam, sim, de receber apoio e treinamento neste sentido.

A parte psicológica também fica esquecida nesse cenário: 75% dos professores também revelaram que não receberam nenhum suporte emocional das escolas neste momento tão difícil e incerto. A psicóloga e coordenadora da Academia de Talentos do Instituto Mauá de Tecnologia (IMT), Gabriela Azevedo, ressalta que, assim como todas as pessoas, os profissionais da educação também estão passando por todas as incertezas e ansiedades provocadas pela pandemia. Além da vida escolar, eles precisam gerenciar a própria casa e cuidar dos filhos. 

A nova rotina de trabalho traz mais estresse e ansiedade. “No ambiente virtual, a atenção precisa ser ainda maior, já que, muitas vezes, não é possível captar a expressão do aluno, por exemplo. Sem esse recurso de sala de aula, o professor se esforça mais para saber se o aluno está interessado ou não naquele tema”, explica a especialista.

Gabriela também fala que esse momento de ensino remoto faz com que os professores fiquem mais expostos às críticas dos pais, que muitas vezes falam que eles não estão trabalhando durante a quarentena. “No começo da pandemia, o pensamento era que eles precisavam se preparar para uma nova rotina, não esperavam que iam ficar tão expostos. Por isso, o cuidado emocional desses profissionais é muito importante”, conclui a psicóloga.  

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